quinta-feira, 23 de novembro de 2017

|| Alguma coisa eu fiz bem

O meu filho Gabriel sabia que eu ia à televisão falar sobre um assunto sério, mas eu não lhe disse qual. Achei que era too much para uma criança de 8 anos, por lhe faltar o entendimento necessário para ouvir cada palavra que proferi naquela entrevista sobre o pós-parto dele.
Insistiu imenso para ver a entrevista na televisão, e, sem eu saber muito bem como, sentei-me com ele e expliquei-lhe que conversa foi aquela que tive com a Fátima Lopes:

- Filho, a mãe foi falar sobre aquilo que senti quando tu nasceste. A mãe não gostou logo de ti, por medo.
- De quê?
- Medo de não saber cuidar de ti, eu sentia-me muito cansada depois de nasceres, a mãe sentia-se sozinha, não tive muita ajuda, tinha que cuidar de ti e fazer tudo em casa, sozinha. Além disso, eu tinha medo de estar sozinha contigo, tinha medo de te pegar ao colo, de te deixar cair, eu sentia que não era boa mãe para ti e isso magoou-me, fez-me ficar muito triste. Eu chorava muito, andava sempre cansada e irritada, e não te pegava ao colo.
- Mãe, mas podias ter pegado em mim em cima da cama, se eu caísse não me magoava.
- Eu sei filho, e muitas vezes aconcheguei-te deitada na cama, mas doía-me tanto, tinha medo de sem querer sufocar-te, medo de te dar de mamar porque me doía muito as mamas. E a mãe foi à televisão falar sobre isso porque há outras mulheres que estão neste momento a sentir o mesmo, sentem-se tristes e com medo e é importante que elas saibam que não faz mal elas dizerem que têm medo, que ainda assim podem ficar bem e serem boas mães. Eu achava que tu nunca irias gostar de mim por eu ter demorado a perder o medo.
- Oh mãe... Eu sei que tu gostas de mim e tu és boa mãe. E podes ter a certeza absoluta que eu e o Mateus gostamos muito de ti.

E com isto, fiquei eu também com a certeza absoluta de que alguma coisa eu fiz bem durante estes anos. Eu sei que nunca vou recuperar o tempo que perdi enquanto estive doente e menos disponível para o meu filho, mas tenho a certeza de que tenho feito um bom trabalho, inclusive fazê-lo feliz.


Ps. Podem ver a entrevista na íntegra aqui.

segunda-feira, 20 de novembro de 2017

|| De mãe para mãe

Eu não sei quem tu és, tu também não sabes quem eu sou, mas só preciso de um minuto da tua atenção.
Respira fundo, não estás sozinha.
Deixa-me dizer-te que também já estive aí onde estás, as dúvidas, os medos, as angústias, foram as mesmas que me acompanharam durante anos. A má notícia é que isso nunca vai te vai passar, a boa é que podes ser mais forte que isso.
Eu sei que estás farta dos conselhos da mãe, da sogra, da tia, da vizinha, farta de dar ouvidos a quem não te consegue olhar por dentro, a quem não te alcança a alma de mulher ferida e de mãe frágil. Afinal todas elas criaram bem os seus filhos; são todos (im)perfeitos.
Quantas vezes te apeteceu gritar e expulsar essas vozes da tua vida? Da tua casa?
Quantas vezes sorriste cordialmente para não magoar a opinião alheia?
Quantas vezes te sentiste diminuída e sufocada?
Quantas vezes te fizeram sentir incapaz, como se fosses um perigo para o teu filho?

Eu tenho outra boa notícia para ti, podes livrar-te disso.
Não te vou dizer que vai ser fácil, que não haverão dias em que te irás questionar se foi a decisão certa, se não era preferível ter aquela gente toda na tua vida a opinar, ao invés de ficares sozinha por tua conta e risco e sentires-te abandonada.
Não te vou dizer que não haverão dias em que desejarás não ter nascido mulher e teres dúvidas de se ser mãe foi a tua melhor escolha na vida. Serão inúmeros.
Não te vou dizer que a tua luta contra uma sociedade cruel e seletiva não será inglória e desgastante, será bem mais dura do que aquilo que alguma vez possas imaginar.
Mas posso-te assegurar que para além dos obstáculos, existirá uma coisa da qual te poderás sempre orgulhar: ser livre.
Ahhh... Não existe nada mais reconfortante do que a liberdade, a liberdade de escolheres a mãe que queres ser, a liberdade de escolheres a mulher que queres conquistar.

A tua mãe diz que és má mãe se abdicares de momentos com os teus filhos em prol de uma carreira ou de umas férias sozinha com o teu marido/namorado ou de uma saída para a discoteca com as tuas amigas; a tua sogra dirá que é muito melhor mãe e que educaria melhor o teu filho do que tu, mesmo ela não tendo sido capaz de fazer grande coisa pelo teu marido; a tua vizinha comenta que és uma má mãe porque te ouve gritar com os teus filhos quando perdes a paciência e dizes que os vais embalar numa caixa e manda-los para a Bolívia só com bilhete de ida, a tua tia e as tuas primas dizem que és uma vergonha porque preferes investir em ti, na tua carreira e nos teus estudos por mero capricho, que o melhor que fazias era ir trabalhar das 8h às 19h como qualquer boa mãe sacrificada faz.
O teu pai diz que não és capaz de ser independente e que ser mãe solteira com filhos neste mundo é muito difícil, que o melhor que tens a fazer é engolir três ou quatro (ou milhares) sapos e manteres o casamento que felicidade nenhuma te traz para que nunca te falte nada, a ti e aos teus filhos.
E tu? Que mulher habita aí dentro? Que mãe queres tu ser? Que exemplo queres dar aos teus filhos, o da mãe e mulher submissa e conformada, ou da mãe e mulher independente que tem em si todos os sonhos do mundo?
Não me digas que é complicado, que irias perder muito, que irias causar discórdias e conflitos, que irias magoar os teus filhos e romper laços dos quais precisas ter para não perderes a noção de pertença. Isso são desculpas, desculpas que te roubam a oportunidade de seres, realmente, quem sempre quiseste ser.

Eu sei que é difícil. É. Muito. Não te vou mentir.
Tirar-te-á muitas noites de sono, trará muita revolta, irás questionar imensas vezes se terá sido a melhor opção, irás chorar muito pelo silêncio que fará ruído em ti, sentirás abandono, terás medos terríveis, sentirás que na verdade tu nunca importaste, duvidarás dos outros e até de se serás capaz sozinha, durante muito tempo andarás como se te faltasse um membro.
Mas nada dura para sempre, e a única coisa que te posso garantir é que é libertador.
É libertador dependeres só de ti, dependeres da tua vontade, dares voz ao teu querer. É libertador poderes pensar e decidir por ti, sem interferências, poderes escolher e assumir as consequências dessas escolhas. Mais do que isso, veres nos teus filhos a confirmação de que és muito mais e melhor do que aquilo que alguma vez te possam ter dito.
Seres mãe não significa que tenhas que perder a identidade, que tenhas que guardar os teus sonhos no bolso, não significa que tenhas de te colocar em último lugar em tudo. Às vezes colocares-te em primeiro lugar é colocares também os teus filhos no mesmo sítio, porque a felicidade dos teus filhos é proporcional à tua, e o facto de às vezes não estares presente não significa que não estejas do lado deles, muito pelo contrário, a tua ausência para viveres os teus sonhos também é uma forma de ama-los porque com isso mostras-lhes que devem respeitar-se e lutar pelos seus sonhos.
Anulares-te é o teu maior erro e nunca fará de ti melhor mãe, muito pelo contrário, fará de ti uma mulher frustrada e em piloto automático, além de que irás cometer o segundo pior erro da tua vida que é colocar, inconscientemente, o peso da expectativa em cima dos teus filhos em que eles terão que recompensar-te no futuro pela decisão de teres abdicado da tua vida por eles.

Mantém-te firme e confia, em ti e na vida. Há pessoas boas que Deus nos vai colocando no caminho, e o fardo vai sendo mais suportável, mais leve.
Digam o que disserem os outros, eles não te conhecem, eles não sabem quem tu és e nunca se preocuparão em conhecer. Eles não te vêem por dentro, só vêem aquilo que querem. E isso não é uma escolha tua, é uma escolha deles.
Digam o que disserem, é a opinião deles, e com a opinião dos outros, podes tu bem.

Faz da tua vida um orgulho e um exemplo para os teus filhos, mas sobretudo, sê, genuinamente, feliz.