sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

A mãe é que sabe || Amamentar não é para quem quer, é para quem pode.

Hoje estou de mau humor, e como de mau humor que estou é sempre uma boa altura para vomitar as coisas que mais me chateiam. Talvez assim não me levem a mal.
No que toca ao tema "amamentar", existem sempre as opiniões de dois lados de uma moeda. É como em tudo na vida.
Eu já falei sobre este assunto aqui, um sítio onde me convidaram para escrever umas coisas. Mas claro, não podia deixar de vir partilhar mais do mesmo, porque, apesar de ser um assunto muito batido, ainda há quem o desconheça, ou se calhar, quem queira desconhecer.
Há uns dias deparei-me com uma lavagem de roupa, sem estar suja, no facebook, nos comentários de uma publicação sobre amamentação, de uma moça qualquer, em que uma amiga minha se meteu ao barulho. Pelo que percebi, uma rapariga disse, através de um comentário, que há mulheres que ainda "perdem" tempo a amamentar com leite materno e que isso é uma coisa de pobre. Sim, foi isto mesmo que a rapariga defendeu.
Claro está que, apesar das opiniões divergirem no que toca a este assunto, tenho a impressão de que se aquilo fosse um debate cara à cara, ia haver mortos e feridos. Os comentários eram de uma tamanha agressividade, de uma coisa tão deprimente que ao passar os olhos naquilo fiquei boquiaberta. E note-se, 99% dos comentários eram femininos.
No momento em que li aquilo, apeteceu-me comentar, mas achei aquilo tão triste que a minha opinião ia-se tornar ali mais uma acha para uma fogueira que eu não queria alimentar.
Mas como mulher e mãe de dois miúdos, este assunto toca-me até às entranhas.
Então é assim: mulheres, deixem de ser parvas umas com as outras, por amor de Deus!
Tanto é parva aquela que acredita que o leite materno é o único aceitável para alimentar um bebé, como é parva aquela que acredita que investir no aleitamento materno é coisa de pobre e uma perda de tempo.
Isto é uma guerra que não tem eira nem beira! Esta coisa do amamentar não é para todas. Por muito que nos expliquem como funciona, por muitas dicas e mimimis que nos digam durante os 9 meses de gestação, só isso não basta para nos preparar para o incerto. E incerto porquê? Porque ninguém nos garante que iremos ter umas mamas fartas de leite. Às vezes as coisas correm mal e nem leite chega, sequer, a haver.
Também ninguém nos garante que nos iremos sentir confortáveis com o nosso corpo para expô-lo e partilha-lo com os olhares alheios. Sim, é um bebé frágil e indefeso, portanto não há nada de sexual no amamentar. Mas existem os outros, aqueles que ficam de fora, que olham com todo o pudor do mundo como se nunca tivessem visto mamas na vida, e esses olhares podem muito bem causar desconforto.
Antes de respeitar a nutrição do bebé, a mãe deve respeitar a sua vontade. Não é porque a mulher dá à luz  a um ser muito importante na sua vida que ela deve anular-se, forçar-se a fazer o que é socialmente correto, mesmo que isso a deixe frágil. A mãe continua a ser um ser humano, a ser uma mulher! Passar por cima das suas convicções, forçar-se a fazer o que não lhe faz feliz, ir pelas opiniões dos outros, 99% das vezes corre mal. Eu sou um exemplo vivo disso.
Eu tive aulas de preparação para o parto aquando da minha primeira gravidez, onde me foram ensinadas técnicas para preparar as mamas para amamentar quando o bebé nascesse. Usei-as todas, era o meu primeiro filho, era muito jovem, portanto, eu fazia o que os mais "experientes" me diziam para fazer, assim o risco de falhar era quase nulo. Julguei eu... É que além de nós, existem as falhas dos outros, e quanto a essas, nada podemos fazer para as evitar, porque, simplesmente, não conseguimos prever os atos dos outros.
No dia do parto, ainda mal tinha parido (sim, eu digo parir porque é uma palavra natural) e estava já a ser suturada, ainda mal tinha caído em mim de que acabara de ser mãe, de repente, só sinto levantarem-me a bata, que me tinham vestido quando entrei na maternidade, sem pedirem qualquer licença, e quando dei por mim estava a enfermeira a espremer-me o mamilo, sem dó nem piedade, e a pôr o miúdo de barriga para baixo em suspenso para ele tentar sugar o colostro que ainda mal saía.
Naquele momento senti-me tão mal, tão exposta, que posso-vos dizer que aquele foi o pontapé de saída para olhar de lado para a amamentação, por ver nela uma agressão à minha privacidade.
Como isso ainda não tinha sido o suficiente, quando fui para casa e o leite começou a subir, eu ia enlouquecendo. Comecei a ganhar gretas nos mamilos, ganhei mastites, e o diabo a 7. Portanto, quando o meu filho fez 4 meses eu parei de amamentar por iniciativa própria. Já não aguentava mais, além de que nessa altura já estava com uma depressão pós parto bastante grave.
Com essa decisão, vieram também as opiniões alheias. A minha mãe a pressionar para eu não deixar de amamentar porque, segundo ela, é quase um crime não dar leite da mama, depois tinha  a sogra a fazer o mesmo tipo de pressão mas mais subtil, a cunhada, a prima, a vizinha. Só a pediatra do meu filho, por ver o real estado em que eu já estava, e por saber as consequências que isso poderia trazer para o crescimento emocional do bebé, aconselhou-me a parar de amamentar. Portanto, foi uma decisão bem solitária, mas manti-me firme, porque era somente o bebé ou nós.
Na minha segunda gravidez eu já dizia que não ia amamentar, ainda por cima já sabia que ia ficar 1 ano em casa para tomar conta do bebé, eu não queria voltar a passar pelas mesmas coisas, queria estar bem para poder dar o melhor ao meu filho. Mas quando ele nasceu, o que era "nem pensar" passou a um "porque não?", e lá experimentei amamentar. O que é certo é que correu bem. Hoje já não amamento porque, infelizmente, fiquei sem leite. Mas o facto de ter dado mama foi uma decisão minha, desta vez muito ponderada.
Isto tudo para dizer o quê? Amamentar não é para quem quer, é mesmo para quem pode. Primeiro é preciso que a mulher pondere se quer ou não amamentar, se se sente confortável em faze-lo em público. Sim, porque os miúdos não têm nenhum botão de On/Off para poderem esperar até chegarem a casa, é onde calhar! É preciso também que perceba que terá de ter paciência até o bebé se adaptar ao mamilo e também ela se adaptar à nova condição da maternidade.
Se depois de analisar tudo muito bem a mulher decidir não amamentar e passar a dar leite da lata, tudo bem à mesma! O leite de lata também tem todas as propriedades necessárias para o bom crescimento dos bebés. Aquela coisa de "leite da maminha é que é bom, o resto não presta" está, de todo, ultrapassado.
A mulher que decide não dar mama merece tanto respeito quanto aquela que decide dar, porque ambas respeitam a sua vontade, ambas tiveram que ter a mesma coragem, porque amamentar não é fácil mas também não o é para aquelas que também decidem enfrentar a sociedade inquisitória.
Em pleno século XXII, ainda existe muita luta contra a violência nas mulheres, mas o mais irónico é que são as mulheres que mais se violentam umas às outras, por meio destas brigas de feira (que então em redes sociais são uma coisa linda de se ver!) a ver quem é que ganha o troféu da razão, quando não ganham mais do que o troféu da estupidez.
Amamentar não é uma coisa de rico ou de pobre (como eu li nos comentários daquela publicação), é uma escolha que merece respeito. É preferível um bebé ter uma mãe feliz e 100% capaz, do que uma mãe frustrada que faz o que a sociedade espera dela. É aí mesmo que começa o exemplo para os nossos filhos: ser aquilo que queremos ser e não aquilo que esperam que sejamos.
Por isso, parem de ser estúpidas e cabras umas para as outras! Respeito gera respeito. Tolerância gera tolerância.
E lembrem-se, o amor não se come nem se oferece pelo tipo de leite que se dá aos bebés. É nos gestos e no exemplo que escolhemos ser que está o verdadeiro "amar mais que a nós mesmas".
O resto são só merdas que não interessam a ninguém.



7 comentários:

  1. "mulheres, deixem de ser parvas umas com as outras, por amor de Deus!" acho que esta frase diz tudo. Nao tenho filhos. Nem sei como será quando/se os tiver. Mas a mulher tem direito de escolher se quer ou nao amamentar. E se consegue ou não -- que também pode ser o problema!. é bom para o bebé, ja sabemos isso. Agora se a mãe vai trabalhar ao fim de 4 ou 5 meses, não vai puder amamentar o bebe durante esse tempo. O problema aqui está a cabeças das pessoas e das outras mulheres que tendem em criticar tudo e mais alguma coisa!
    beijinho

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    1. Nem mais! Enquanto as mentes não mudarem vai continuar a haver esta estupidez sem jeito nenhum. É que isto é capaz de mexer muito a sério até na forma como a mãe vê o seu próprio filho porque nessa altura estão tão fragilizadas que nem conseguem raciocinar direito, e as pessoas, muitas vezes com a mania de que elas é que sabem, provocam um sentimento de culpa brutal na mãe quando ela decide algo contrário às expectativas.
      Tenho esperança de que a pouco e pouco as coisas mudem.

      Beijinho

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  2. Olá Márcia, o que descreves é bem verdade. Eu fui mãe há quase 5 meses, queria muito dar de mamar, mas não consegui... tenho vitiligo na pele (falta de pigmentação) o que torna a pele muito mais sensível. Foram duas mamadas de cada lado e o mamilo gretou e por isso, ainda na maternidade, optei por não insistir mais porque era bem doloroso. E não é que a Obstetra que me foi dar a alta, porque o meu médico fez o parto e no dia seguinte foi de férias:(, queria obrigar-me a amamentar e não queria passar-me a receita do comprimido para a secagem do leite!! É incrível, como é que as pessoas acham que podem decidir por nós quando se trata de amamentação.

    Fiquei fã do blog, já estou a seguir, gostava muito que seguisses o meu também :). Beijinhos

    http://Meninaricameninapobre.blogspot.com

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    1. Olá Sandra, antes demais obrigada por me seguires. Também já estou a seguir o teu blog.
      Eu sei o que sentiste na maternidade porque eu também o senti tanto na maternidade como fora dela. Cada vez existe mais pressão para as mulheres amamentarem, mesmo contra a sua vontade, e a pressão começa exatamente na maternidade onde ninguém nos dá espaço para ponderar e decidir. Isso é quase desumano porque, de repente, a mulher tem que esquecer quem é, que também sente dores e que não quer passar por certas coisas, tudo em prol de um bebé. O que os profissionais de saude esquecem, muitas vezes, é que a estabilidade física e emocional do bebé começa exatamente na estabilidade física e emocional da mãe, mesmo fora do útero, os dois continuam a viver em simbiose.
      Acho que além de aprenderem medicina os profissionais deviam aprender um bocadinho de psicologia, talvez se evitassem muitas depressões pós parto e afins.

      um beijinho

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  3. Apesar de nunca ter sido mãe, acho que a amamentação é algo que só cada mãe pode decidir nunca esquecendo que é preciso ter em conta as diferentes circunstancias!

    Bjxxx

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  4. Olá, deparei-me com o teu blog e fui direita a este artigo. Para te ser franca vieram-me as lágrimas aos olhos por momentos. Tenho um filho de 4 anos que nunca amamentei. Logo a seguir ao parto fiz a secagem do leite por indicação clínica (sou doente psiquiátrica e tomo muita medicação para andar estabilizada, os componentes químicos passariam para o leite, com grande prejuízo para o bebé). A minha decisão foi naturalmente fácil de tomar, pois não estar medicada não era uma possibilidade, sob pena de um total desequilíbrio mental, já para não mencionar uma depressão pós-parto que, em mim teria consequências nefastas devido ao meu problema. Nem podes imaginar o que foi o meu calvário! Desde uma pediatra na maternidade que se recusou a ver o meu Filho até enormes raspanetes de profissionais de saúde ignorante e mal informados, que, quais cordeirinhos, debitam teorias da moda sem olhar a meios nem consequências. Certa vez foi preciso o meu Marido gritar com uma enfermeira, só para veres a gravidade da situação. A verdade é que nunca vacilei, o meu amor de mãe foi mais forte que tudo. Sim, não amamentei porque amo o meu Filho acima de qualquer coisa ao cimo da terra. Hoje em dia, regozijo-me de dizer à boca cheia a todos quantos me criticaram (o leite materno é que é bom, as defesas naturas, blá, blá, blá...) que o meu pequenote goza de uma saúde de ferro e é uma criança muito alegre, carinhosa e acima de tudo, tem a felicidade estampada no rosto! Desculpa o testamento, mas também foi importante para mim "vomitar" isto tudo!! Obrigada. bj

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    1. Não tens que pedir desculpa, o meu objetivo aqui é partilhar as minhas experiências e obter o feedback de que me lê, é uma troca que para mim vale muito!
      Eu entendo bem o que dizes, eu tenho tendência para a depressão, na primeira gravidez tive logo a depressão pós parto 2 semanas depois de o ter, desta vez foi diferente, andei a fazer-me de forte durante 5 meses até que há 1 mês atrás não aguentei mais e assumi que precisava de ajuda. Para já não tomo nada, faço só psicoterapia, o que ajuda imenso, mas se tiver que recorrer a antidepressivos pois que seja, não queria mas... vamos ver.
      Eu tive os meus dois filhos em maternidades diferentes mas em ambas achei agressiva a abordagem do pessoal médico, especialmente enfermeiras. Nunca me perguntaram se eu tinha intenção de amamentar, simplesmente metiam o miúdo na minha mama e bora lá! E eram assim com todas as outras mães. A mulher tem o direito de escolher, seja por motivos médicos, seja por crenças, seja por opção. Eu continuo a dizer, não acho que o leite materno seja todo esse nirvana que apregoam, a ciência evoluiu taaanto, já na altura em que nasci havia o leite de lata, os tempos evoluiram logo as fórmulas dos leites também, os bebés não morrem ou ficam mais frágeis se beberem leite de lata! Ok, o leite materno é mais económico, tem propriedades muito positivas ao nível da imunidade mas who cares? Não importa se o bebé mama da mama ou do biberão, o que importa é que cresça feliz e saudável, o resto são só balelas nas quais eu não acredito.
      Muito obrigada pelo teu testemunho, obrigada pela tua visita, de coração!

      Beijinho :*

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